RESENHA
HISTÓRIA DA INTERPRETAÇÃO BÍBLICA
" Uma visão geral histórica da interpretação Bíblica capacitar-nos-á a vencer a tentação de crer que nosso sistema de interpretação é o único que já existiu. Um entendimento dos pressupostos de outros métodos proporciona uma perspectiva mais equilibrada e uma capacidade para um diálogo mais significativo com os que crêem de modo diferente. Um estudo da história da interpretação bíblica começa, em geral, com a obra de Esdras. Ao voltar do exílio na Babilônia, o povo de Israel solicitou a Esdras que lhes lesse o Pentateuco. Neemias 8:8 lembra: “Leram (Esdras e os Levitas) no livro, na lei de Deus, claramente, dando explicações, de maneira que entendessem o que se lia.”
Visto que, durante o período do exílio, os israelitas provavelmente tenham perdido sua compreensão do hebraico, a maioria dos eruditos bíblicos supõe que Esdras e seus ajudantes traduziam o texto hebraico e o liam em voz alta em aramaico, acrescentando explicações para esclarecer o significado. Assim, pois, começou a ciência e arte da interpretação bíblica.
No tempo de Cristo, a exegese judaica podia classificar-se em quatro tipos principais: literal, midráshica, pesher e alegórica
Filão acreditava que a interpretação literal da Escritura representava um nível imaturo de compreensão; o significado alegórico era para os maduros.
Jesus foi uniforme no tratar as narrativas históricas como registros fiéis do fato e quando fazia aplicação do registro histórico, Ele o extraía do significado normal do texto, contrário ao sentido alegórico. Não demonstrou tendência alguma para dividir a verdade escriturística em níveis- um nível superficial baseado no significado literal do texto e uma verdade mais profunda baseada em algum nível místico.
Jesus foi uniforme no tratar as narrativas históricas como registros fiéis do fato e quando fazia aplicação do registro histórico, Ele o extraía do significado normal do texto, contrário ao sentido alegórico. Não demonstrou tendência alguma para dividir a verdade escriturística em níveis- um nível superficial baseado no significado literal do texto e uma verdade mais profunda baseada em algum nível místico.
Na realidade Jesus até denunciava o modo como os dirigentes religiosos haviam desenvolvido métodos casuístico que punham à parte a própria Palavra de Deus que eles alegavam estar interpretando, e no lugar dela colocavam suas próprias tradições.
Diante dos fatos expostos em relação a como Jesus entendia e tratava as narrativas históricas do Antigo testamento, e como isto nos ajudaria na interpretação do mesmo, entendemos que uma forma de interpretar adequadamente o texto é verificar na própria palavra se existe uma alusão do próprio Senhor Jesus ao texto estudado. Além disso, é perfeitamente aceitável que a bíblia é interpretada pela própria bíblia, ou seja, não precisamos inventar formas novas de interpretação, até porque, à semelhança de Cristo, até os apóstolos aceitaram a exatidão histórica.
Ao citar o Antigo Testamento, com freqüência o Novo (pelos Apóstolos) modifica o fraseado primitivo. Essa prática pode ser justificada hermeneuticamente considerando três posições aqui pertinentes.
Primeira, diversas versões em hebraico, aramaico e grego do texto bíblico circulavam na Palestina no tempo de Cristo, algumas das quais tinham fraseado diferente das outras. Uma citação exata de uma dessas versões podia não ter a mesma redação dos textos dos quais se fazem nossas presentes traduções, não obstante ainda representem a interpretação fiel do texto bíblico disponível ao escritor do Novo Testamento.
Segundo, conforme observa Wenham, não era necessário que os escritores citassem passagem do AT, palavra por palavra, a menos que alegassem estar citando IPSIS VERBIS, particularmente porque estavam escrevendo numa língua diferente dos textos originais do AT.
Terceiro, na vida comum, não estar preso a citação é, geralmente, sinal de que o autor tem domínio da matéria; quanto mais seguro está o orador de entender o significado de um autor, tanto menor o medo que ele te de expor essas idéias em palavras que não são exatamente as do autor. Por esses motivos, pois, o fato de que os escritores do NT às vezes parafrasearam ou citaram indiretamente o Antigo não indica, de forma alguma, que usaram métodos interpretativos ilegítimos.
O método alegórico foi desenvolvido na era patrística e derivou-se de um propósito digno- o desejo de entender o AT como documento cristão, contudo, muitas vezes, negligenciou por completo o entendimento de um texto e desenvolveu especulações que o próprio autor nunca teria reconhecido. Uma vez abandonado o sentido que o autor tinha em mente, conforme expresso por suas próprias palavras e sintaxe, não permaneceu nenhum princípio regulador que governasse a exegese.
Na interpretação de Clemente de Alexandria, percebe-se que ele acreditava que as escrituras ocultavam seu verdadeiro significado a fim de que fôssemos inquiridores, e também porque não é bom que todos entendam. Desenvolveu a teoria de que cinco sentidos estão ligados à Escritura (histórico, doutrinal, profético, filosófico e místico), com as mais profundas riquezas disponíveis somente aos que entendem os sentidos mais profundos.
Orígenes cria ser a Escritura uma vasta alegoria na qual cada detalhe é simbólico, e dava grande importância a 1Co 2:6-7 (“falamos a sabedoria de Deus em mistério”). Acreditava, ainda, que assim como o homem se constitui de três partes- corpo, alma e espírito- da mesma forma as Escrituras possui três sentidos. O corpo é o sentido literal, a alma o sentido moral, e o espírito o sentido alegórico ou místico. Na prática, Orígenes tipicamente menosprezou o sentido literal, raramente se referiu ao sentido moral, e empregou constantemente a alegoria, uma vez que só ela produzia o verdadeiro conhecimento.
Já o método de interpretação de Agostinho, na prática, renunciou a maioria dos seus próprios princípios e inclinou para uma alegoria excessiva. Essa prática faz que seus comentários exegéticos sejam alguns dos menos valiosos de seus escritos. Ele justificou suas interpretações alegóricas em 2 Co 3:6 (porque a letra mata, mas o Espírito vivifica ), querendo com isto dizer que uma interpretação literal da Bíblia mata, mas uma alegórica ou espiritual vivifica.
Ele cria que a Escritura tinha um sentido quádruplo- histórico, etiológico, analógico e alegórico. Sua opinião foi predominante na idade média. Portanto, a influencia de Agostinho no desenvolvimento de uma exegese científica foi mista; na teoria ele sistematizou muitos dos princípios de exegese sadia, mas na prática deixou de aplicar esses princípios em seu estudo bíblico.
Os princípios exegéticos da escola de Antioquia lançaram a base da hermenêutica evangélica moderna. Infelizmente, Nestório, discípulo de Teodoro, envolveu-se numa grande heresia concernente à pessoa de Cristo, e sua associação com a escola, paralelamente a outras circunstâncias históricas, levou esta promissora escola de pensamento a encerrar suas atividades.
O desenvolvimento hermenêutico praticamente parou na Era Medieval (600 – 1500) porque a maior parte dos estudantes da bíblia devotava-se a estudar e compilar as obras dos Pais primitivos. A interpretação foi amarrada pela tradição, e o que se destacava era o método alegórico.
Mas, de acordo com Lutero, uma interpretação adequada da Escritura deve proceder de uma compreensão literal do texto. O interprete deve considerar em sua exegese as condições históricas, a gramática e o contexto. Ele acreditava, também, que a Bíblia era um livro claro ( a perspicuidade da Escritura ), contrariamente ao dogma católico romano de que as escrituras são tão obscuras que somente a igreja pode revelar seu verdadeiro significado.
“A Escritura interpreta a Escritura” era uma sentença predileta de Calvino, a qual aludia à importância que ele dava ao estudo do contexto, da gramática, das palavras, e de passagens paralelas, em lugar de trazer para o texto o significado do próprio intérprete.
O erro hermenêutico dos pietistas que não devemos repetir hoje se deu porque muitos pietistas mais recentes descartaram a base de interpretação histórico-gramatical, e passaram a depender de uma “luz interior” ou de “uma unção do Santo”. Essas manifestações, baseadas em impressões subjetivas e reflexões piedosas, muitas vezes resultaram em interpretações contraditórias e que pouca relação tinha com o significado do autor.
Diante de tanto antagonismo surge o racionalismo, posição filosófica que aceita como a única autoridade que determina as opções ou curso de ação de alguém, que cedo devia causar profundo efeito sobre a teologia e a hermenêutica. Durante vários séculos antes, a igreja havia acentuado a racionalidade da fé. Considerava a revelação superior à razão como meio de entender a verdade, mas a verdade da revelação foi tida como inerentemente razoável.
Segundo Lutero, o papel legítimo e ilegítimo da razão na interpretação Bíblica estabeleceu-se pela distinção entre o uso magisterial e o ministerial da razão. Por uso ministerial da razão ele se referia ao emprego da razão humana para ajudar-nos a compreender e a obedecer mais plenamente a Palavra de Deus. Por uso Magisterial da razão ele se referia ao emprego da razão humana como juiz sobre a Palavra de Deus. Lutero afirmava claramente a primeira e rejeitava a segunda.
De acordo com o Liberalismo, percebemos que a inspiração é entendida analisando o seguinte: ao passo que nos séculos anteriores a revelação havia determinado o que a razão devia pensar, no final do século XIX a razão determinava que partes da revelação ( se houvesse alguma ) deviam ser aceitas como verdadeiras. Onde nos séculos anteriores a autoria divina da Escritura fora acentuada, agora o foco era sua autoria humana. Alguns autores diziam que várias partes da Escritura possuíam diversos graus de inspiração, e podia ser que os graus inferiores ( como detalhes históricos ) contivessem erros. Outros escritores, como Schleirmacher, foram além, negando totalmente o caráter sobrenatural da inspiração. Muitos já não mencionavam a inspiração como processo pelo qual Deus guiou os autores humanos a um produto escriturístico que fosse a sua verdade. Pelo contrário, a inspiração referia-se à capacidade da Bíblia ( produzida humanamente) de inspirar experiência religiosa.
A neo-ortodoxia é um fenômeno do século XX. Ela ocupa, em alguns aspectos, uma posição intermediária entre os pontos de vista liberal e ortodoxo. Rompe com a opinião liberal de que a Escritura é tão só produto do aprofundamento da consciência religiosa do homem, mas detém-se antes de chegar à perspectiva ortodoxa da revelação."
Ao analisar o texto “HISTÓRIA DA INTERPRETAÇÃO BÍBLICA”, percebi que às várias formas de interpretação dos Escritos Bíblico resumidas no texto acima mostram as diversas possibilidades de interpretações características de cada época.
O autor é bastante cuidadoso quando cita que quem possui uma visão histórica geral da interpretação bíblica está mais apto a vencer a tentação de crer que seu sistema de interpretação é o único e, dessa forma, o melhor. Posso acreditar que através desse pensamento surgiram as várias escolas de interpretação dos Escritos e acima de tudo, hoje, há uma compreensão do porque da existência das diversas denominações.
Aprofundando a questão, é notaria a necessidade de buscar no próprio texto Bíblico um porque da existência da hermenêutica e, com isto, reporta-se ao livro de Neemias para se falar que Esdras e os levitas liam e explicavam os textos em alta voz em aramaico porque os israelitas do período do exílio provavelmente perderam a compreensão do hebraico.
Uma forma de trazermos para o dia de hoje a certeza de estarmos interpretando corretamente os Escritos é procurar ver na pessoa de Jesus qual é a sua interpretação; o que Ele falava a respeito de tal trecho encontrado no Antigo Testamento? Ele interpretava literalmente ou alegoricamente? Mas Filão acreditava que a interpretação literal representava um nível imaturo de compreensão, contudo, a alegórica era para maduros. Apesar de Filão ser radical, conforme expõe o autor, penso que ele não estava totalmente errado pois o conhecimento histórico e cultural do povo e da época faz ampliar a visão do leitor ao ponto de o mesmo ter a segurança de dizer que a interpretação é literal ou alegórica, e, comprovar tal entendimento.
Até este ponto da análise do capítulo dois não se tem exatamente a posição do autor, pois ele está preocupado em apresentar os fatos históricos. Um dos problemas do método alegórico, percebido, ainda que com a boa intenção de se entender o AT como documento cristão, era porque se negligenciava por completo o entendimento do texto e abandonando o sentido que o autor tinha em mente não se mantinha nenhum princípio que controlasse a exegese, pois a interpretação era particular. Clemente de Alexandria e Orígenes defendiam a alegórica, aliás, este tipicamente menosprezou o sentido literal acreditando que só ela produzia o verdadeiro conhecimento.
Até Agostinho que influenciou o desenvolvimento de uma de uma exegese científica, na teoria, na prática deixou de aplicar esses princípios em seu estudo Bíblico. A Escola de Antioquia, com seus princípios exegéticos, lançou a base da hermenêutica moderna, mesmo assim, devido a heresia concernente a pessoa de Cristo, teve que encerrar suas atividades. A situação ficou tão crítica que o desenvolvimento hermenêutico da era medieval praticamente parou, pois a ênfase era o método alegórico.
Lutero e Calvino, embora não tão exaltado pelo autor do livro, foram os ícones da mudança de paradigma. É imperioso que a razão norteie o entendimento do texto Bíblico avaliando as condições históricas, as gramaticais e as contextuais, dessa forma, com o conhecimento da verdade vem à fé. Sendo assim, Lutero contraria o dogma católico romano de que as escrituras são tão obscuras que somente a igreja pode revelar seu verdadeiro significado. E Calvino reafirma esta idéia de Lutero com sua sentença predileta: “A Escritura interpreta a Escritura”.
Diante de tanto antagonismo surge o racionalismo, filosofia aceita como a única autoridade que determina as opções ou curso de ação de alguém, que iria causar profundo efeito sobre a teologia e a hermenêutica. Durante vários séculos antes, a igreja havia acentuado a racionalidade da fé. Considerava a revelação superior à razão como meio de entender a verdade, mas a verdade da revelação foi tida como inerentemente razoável.
Apesar do posicionamento de Lutero com relação ao uso da razão em vez de uma fé fantasiosa, sem limite e sem legislador, ele não aceitava a razão na interpretação do texto como magistrador da Palavra de Deus e sim como auxiliar à compreensão e obediência à Escritura Sagrada.
Com a era moderna percebemos que a racionalização passou influenciar a teologia e hermenêutica de forma preponderante a tal ponto que com o surgimento do Liberalismo houve uma inversão, isto é, a revelação que determinava o que a razão deveria pensar no passado foi subjugada pelo pensamento de que agora é a razão que determina que parte da revelação deveria ser aceita como verdadeira. Os argumentos do Liberalismo foram tomando tanta força que alguns escritores negaram totalmente o caráter sobrenatural da inspiração.
As origens do pietismo remontam ao final do século XVII quando foi proclamada a conversão individual, que revitalizou o luteranismo na Alemanha, permitindo que a Reforma se estendesse a outros países. Durante o século XVIII, a teologia luterana refletiu-se no racionalismo, exacerbado pelo Iluminismo. No século XIX, o teólogo alemão Friedrich Schleiermacher (1769-1834) enfatizou a experiência religiosa universal e exerceu grande influência sobre os luteranos liberais. Ao mesmo tempo, o idealismo— principal movimento da filosofia moderna alemã — teve profundos efeitos no pensamento teológico luterano. No século XX, a neo-ortodoxia existencialista do teólogo calvinista suíço Karl Barth (1886-1968) foi a influência mais importante na teologia luterana.
A neo-ortodoxia, no século XX, vem como uma espécie de legisladora e conciliadora dos pensamentos, pois ela toma uma posição intermediária entre a ortodoxia e o liberalismo, com isto, não quero dizer que ela aceitava e resumia os dois pensamentos antagônicos, muito pelo contrário. Ela entende que quando alguém lê as palavras da Escritura Sagrada e reage com fé a presença Divina, ocorre a revelação. A revelação não é algo ocorrido num ponto histórico, mas uma experiência presente que deve fazer-se acompanhar de uma reação pessoal existencial. Enfim, a visão liberal de interpretação das Escrituras aceita o conjunto de concepções religiosas do indivíduo que lê; para a ortodoxa a Bíblia é a revelação de Deus através de atos e palavras e para a visão neo-ortodoxa a Bíblia é a palavra de Deus revelada de acordo com os atos e manifestações, não considerando que deus falou verbalmente.
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